Ainda sobre os Jogos Olímpicos

por Misha Gibson, que gosta de assistir esportes

171 Todo Dia

Terça, 16 De Agosto De 2016 ás 06:00

Ainda sobre os Jogos Olímpicos

Créditos: Rio2016

Ainda sobre os Jogos Olímpicos

Passada a empolgação da surpreendente abertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, fica a pergunta: Estamos assistindo uma versão deturpada da trilogia Jogos Vorazes? Quando eu pensei que os jogos fossem uma demonstração aos políticos do mundo de que a humanidade não tolera mais a discriminação das diferenças, quando eu pensei que poderíamos encontrar o fim do racismo e da intolerância como um todo, eis que me deparo com uma das cenas mais grotescas de todo o universo olímpico. Um judoca egípcio se recusa a cumprimentar o oponente israelita. Quanta desonra para um esporte que essencialmente preza pelo respeito: ao judô, às autoridades e sim, ao seu oponente. É nesta ordem que se deve fazer a mesura no tatame. E não cumprimentar o oponente é um desrespeito a cultura que criou o esporte, a cultura fundamental daqueles dois desportistas que estavam ali.

Fiquei sabendo que no primeiro dia das olimpíadas,  atletas libaneses impediram que israelenses subissem em um ônibus compartilhado. Quantos casos mais foram abafados? Apavorante saber que ainda existe o ódio por razões que já se perderam no tempo.

Outra coisa apavorante foi saber que muitas camareiras estão denunciando casos de abusos. Olha aí o que é vendido para o resto do mundo! O Brasil é o país do 'Oba', do 'Tudo bem' (Veja aqui, que tem um editorial do NYTimes com um tom altamente positivo para o Brasil, mas que também deve nos fazer pensar.) O quanto de 'rule bending', isto é, jeitinho, podemos aturar? Concordo quando dizem que não vamos conseguir resolver todos os problemas a curto prazo, assim como nenhum problema cultural tem solução fácil. Mas, também não posso dizer que estou contente com os casos abafados. Acho que o país do calor, do samba e do carnaval não é bem o país em que eu moro.

Falando em casos abafados, e o 'apedrejamento' do ônibus de repórteres que entrou por engano na favela da Maré? E a morte do soldado da Força Nacional que morreu na mesma favela? É claro que a violência e o tráfico ainda são problemas sociais. É claro que não vamos ver uma solução a curto prazo. Mas, será que não era o caso de assumir que temos problemas do que dizer que o ônibus de repórteres foi apedrejado por jovens mal intencionados? Não era o caso de dizer que aquela área ainda tem violência, que aquela área ainda está sob observação da polícia e do governo antes dos jogos terem início? Ou estou sendo ingênua e foi apenas má sorte dos repórteres e policiais?

E o caso dos nadadores americanos que foram assaltados? Alguém pode me dizer que coisa mais sem pé nem cabeça é essa? Levaram dinheiro, mas deixaram documentos e celulares? Lembram de verem distintivos, falsos policiais, mas estavam tão bêbados que não lembram de mais nada? Isso pode tanto ser um abafa, tanto quanto um bafão.

Só eu notei os vários atletas sendo naturalizados apenas para poder competir? Não sou contra a troca de experiências, muito menos aprender técnicas e aprimoramentos dos esportes, afinal a modernidade bate à porta e ela não tem nacionalidade. Mas, entender que um time brasileiro é composto por estrangeiros naturalizados me faz achar que fui um tanto enganada. Quer dizer que nossos atletas não estão trocando as experiências, mas estão sendo trocados por atletas estrangeiros com melhores qualidades e que não tiveram oportunidade em seus países de origem? Xenofobia ou uma realidade dura que temos de engolir para sermos patriotas?

Talvez estejamos apenas acostumados a fazer parte de um Distrito, talvez tenhamos esquecido que a Capital não seja mais do que mais de nós. Talvez precisemos de um tordo para nos liderar para a esperança de dias melhores. Os sentimentos de Jogos Vorazes não terminou.

Talvez porque os jogos são aqui no Brasil e talvez porque a nossa imprensa seja do jeito como é que estes casos tenham sido divulgados. Talvez os 'incidentes' sejam indícios de que não toleramos mais esses tipos de coisas. Talvez possamos ter mais tolerância do que imagino em nosso país e ver com alegria o triunfo do amor, como os vários casos de pedidos de casamento nos jogos (homo e hétero afetivos). Talvez eu tenha que focar mais na luta individual dos atletas do que ver o descaso da educação (e, sim, esporte faz parte da educação) em nosso país. Talvez eu precise celebrar mais a festa do circo e pegar mais pão do que aprender a pescar... Talvez eu me alegre quando os jogos acabarem e veja o legado que eles trouxeram. No momento, eu só quero torcer para os brasileiros e me surpreender com os medalhistas.


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